Cresceu na última década o percentual de brasileiros que
tolera o uso de tortura para obtenção de provas contra criminosos e também o
uso da violência policial em alguns casos, segundo levantamento realizado pelo
Núcleo de Estudos de Violência (NEV) da Universidade de São Paulo (USP).
Em 1999, 71,2% dos entrevistados discordavam totalmente do uso
da tortura. O índice caiu para 52,5% em 2010. O número dos que concordam
totalmente ou em parte ou discordam apenas em parte com o uso da tortura
cresceu de 28,8% (1999) para 47,5% (2010).
Para a maioria dos
brasileiros, a polícia deve fazer entrevistas sem uso da violência. Contudo,
aproximadamente um terço concorda que a polícia, para obter informações de
alguns delitos específicos, submeta os suspeitos a métodos extralegais, como
ameaçar com palavras, bater, dar choques ou queimar o corpo com a ponta de
cigarro, ameaçar membros da família ou deixar sem alimentação ou água.
O uso da violência, aponta o núcleo da USP, é mais aceito
para casos de suspeitos de estupro (43,2%), tráfico de drogas (38,8%),
sequestro (36,2%), uso de drogas (32,3%) e roubos (32,1%). Quanto mais jovem o
entrevistado, maior a tendência a aceitar práticas de tortura, segundo a
pesquisa.
Entre as capitais, Belém e Fortaleza são onde houve a
percepção de maior aceitação à violência nos depoimentos. Uma grande maioria,
porém, considerou inaceitável o governo prender alguém sem julgamento (79,7%).
A "Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar sobre
Atitudes, Normas Culturais e Valores em Relação à Violação de Direitos Humanos
e Violência" ouviu 4.025 pessoas com 16 anos ou mais em 11 capitais
brasileiras durante o ano de 2010. O período da coleta de dados não foi
divulgado. As entrevistas foram realizadas em Porto Alegre, São Paulo, Rio de
Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Belém, Manaus, Porto Velho, Goiânia
e Fortaleza.
Para o subcoordenador de segurança urbana da ONG Viva Rio,
Sandro Costa, a maior aceitação da violência policial pode estar ligada à
sensação de segurança da população. "Mesmo em cidades onde os índices
criminais estão em queda, a população continua sentindo muito a presença da
violência nas suas vidas."
Ele se diz preocupado com o resultado do estudo. "Este
posicionamento é equivocado, já que, no estado democrático, os direitos e
garantias individuais devem ser respeitados mesmo para quem transgrediu a
lei", aponta. "Se a sociedade começa a tolerar que estes limites
legais sejam ultrapassados, está concedendo uma procuração para que o operador
de segurança interprete a lei da forma que achar conveniente. E isso não é
correto", diz.
Violência para solução de conflitos
Tanto em 1999 quanto em 2010, os entrevistados discordaram,
em sua maioria, do uso da força física ou violência para solução de conflitos.
Este percentual é significativo, segundo o núcleo da USP. O número de
entrevistados que concorda que uma pessoa tenha direito a matar para defender
seus bens passou de 19,38%, em 1999, para 12,75%, em 2010, enquanto que as que
concordam com o direito de matar para autodefesa caiu de 38,95% para 30,17%.
Também foram levantadas situações em que as pessoas não
aprovariam ou não entenderiam que a violência fosse utilizada. Em 1999, 41,27%
não concordavam com a frase "um conhecido seu matar por vingança quem
violentou a filha dele". Em 2010, o número chegou a 55,12%.
Por outro lado, cresceu a aceitação do uso da força pela
polícia contra criminosos. Em 1999, 87,9% eram contrários que policiais
atirassem contra suspeitos desarmados - o número caiu para 68,6% em 2010.
Também subiu a porcentagem dos que aceitam que a polícia atire contra suspeitos
armados: 62% disseram, em 2010, que "concordam totalmente",
"concordam em parte" ou "discordam em parte". Apenas 38%
discordaram totalmente de uma situação em que um policial atira contra um
suspeito armado. Em 1999, esse número era de 45,4%.
G1
JEFTE NEWS