sexta-feira, 13 de julho de 2012

O Arame Farpado




Os seres humanos costumam desejar ardentemente a mudança, mas possuem um arraigado e poderoso receio dela.

Não por acaso, Thoreau observou que “muitos homens vivem vidas de silencioso desespero”. A espécie humana é dotada da faculdade de pensar e sonhar, por isso eventualmente se dá conta de que vive aquém do que gostaria e elabora fantasias sobre como aproveitar melhor sua existência na Terra. Essa crônica insatisfação poderia ser o gatilho da liberdade, mas na verdade costuma provocar angústias colossais quando bate de frente com uma característica atávica: o irracional medo da mudança. Ou, dito de outra forma, o medo do arame farpado.

Esqueçam fantasmas, feras selvagens, aranhas ou tsunamis. A entidade que mais provoca medo em seres humanos é o arame farpado.

 Por força das circunstâncias, quase todos os homens e mulheres deslizam para uma vida de acomodação; para uma atividade, um emprego ou um casamento que não lhes ofereça grandes riscos mas também não lhes proporcione grandes emoções.

Uma metáfora perfeita para esta situação é a do  cercado com cobertura, rodeado por uma espessa cerca de arame farpado. O animal preso neste cercado tem um local onde se abrigar da chuva, do frio e do calor. Recebe um mínimo necessário de comida e água para sobreviver. Dentro do cercado, está seguro do ataque de predadores, não morrerá de inanição, de frio ou calor. No entanto, através das frestas do arame farpado  pode ver o mundo imenso que há lá fora, com suas planícies e rios, colinas e caminhos para trilhar,  o sol a se por sobre montanhas, o cheiro da brisa do mar. Com estes estímulos, é possível sonhar uma vida melhor, mais rica, mais emocionante, mais plena.
E o animal cercado sonha. Nos sonhos, tudo é perfeito. Fora do cercado, andará descalço às margens dos rios… frutas e animais silvestres lhe darão sustento, verá praias de sonho e ouvirá o som plácido de uma floresta ao entardecer. Encontrará outros de sua espécie, poderá correr, saltar e dançar sobre a grama. Mas ao baixar os olhos percebe que não será fácil atravessar o arame farpado… não sem graves ferimentos e arranhões. E, tal qual a raposa frente às uvas que não pode alcançar, começa a imaginar os obstáculos, os óbices: e se lá fora não houver comida? E se os animais selvagens vierem a seu encalço? E se a neve o soterrar no inverno e o sol o esturricar no verão?

Eis que estremece, vislumbra o fio do arame apontado para si… o fio que vai cortar a carne, que vai roubar-lhe o sangue e deixar cicatrizes longas e duradouras. O arame farpado grita, e o animal resigna-se a voltar para a palha do cercado. Ali… ora, ali a comida é quase intragável, mas não falta. O teto é horrendo, mas protege da chuva. Ali os leões e lobos não podem entrar. Acomodemo-nos, é mais seguro. O animal então adormece, amedrontado demais para sequer imaginar uma forma de fugir.
Fonte:Polifonias

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